História do Ensino da Geologia em Portugal
Análise dos Manuais do Ensino Liceal no Estado Novo (1947-1974)

Tese de mestrado apresentada por Teresa Salomé Alves da Mota em 2001

Resumo
O presente trabalho tem como tema a História da Geologia em Portugal entre 1947 e 1974 através da análise de manuais escolares do ensino liceal. Subjacente à escolha do tema de investigação, encontra-se a assunção de que o modo como uma determinada ciência é ensinada se revela da maior importância na angariação e formação de futuros profissionais.

O período em questão marcou o ocaso do regime autoritário existente em Portugal durante cerca de 50 anos: o Estado Novo. O sistema de ensino era um dos pilares do regime e um poderoso meio de inculcação ideológica. No entanto, e apesar das múltiplas contradições, as lentas mas profundas transformações sofridas pela sociedade portuguesa nesta época acabaram por ter impacto no sistema educativo. É neste contexto social e educativo que as características da Geologia em Portugal emergentes da análise dos manuais escolares utilizados no ensino liceal deve ser compreendido.

Na análise dos manuais foram contemplados os seguintes aspectos: as características mais gerais dos manuais; o tratamento dado aos diversos temas de Geologia abordados; a vertente prática no ensino da Geologia; as imagens de conteúdo geológico; o modo como as teorias geológicas eram apresentadas e tratadas; o entendimento da Geologia enquanto ciência, assim como da sua História.

Essa análise revelou que a Geologia era entendida num contexto histórico-natural, dando-se especial ênfase aos seus aspectos descritivos, especialmente em temas como a Cristalografia e a Mineralogia. Interpretações causais, questões teóricas mais globais e mesmo aspectos históricos da Geologia enquanto reconstituição da história da Terra, apenas eram abordados tardiamente no ensino liceal. As imagens com conteúdo geológico apresentam características idênticas. As representações visuais típicas da Geologia, como mapas, perfis, colunas estratigráficas e uma generalidade de esquemas de carácter causal e temporal, eram quase inexistentes. Também as actividades de carácter prático se limitavam, essencialmente, à observação, descrição e identificação dos objectos em estudo, sendo de salientar que a vertente prática no ensino da Geologia era bastante diminuta.

A abordagem das teorias geológicas nos manuais pautava-se, na maior parte das vezes, por uma atitude monolítica e não problemática em relação às mesmas, encontrando-se esta atitude inscrita numa perspectiva empírico-indutivista com alguns laivos positivistas . Assumindo-se uma demarcação absoluta entre o mundo natural e o mundo social, o conhecimento científico era encarado como o processo através do qual o homem desvenda de forma inequívoca os “mistérios da Natureza,” aproximando-se assim a ciência, cada vez mais, da verdade. As poucas páginas dos manuais dedicadas à História da Geologia são o exemplo acabado desta forma de entender a ciência e o processo científico, destacando-se as “descobertas” individuais de “génios” reconhecidos.

Não sendo a Geologia uma área do conhecimento que se prestasse, por excelência, a ser ideologicamente manipulada pelo Estado Novo, a verdade é que o seu ensino se encontrava perfeitamente conforme aos valores e práticas educativas de um regime autoritário. Nos anos mais precoces do ensino liceal, os poucos conhecimentos geológicos abordados eram mesmo explicitamente utilizados como veículo da mensagem ideológica do regime. Por outro lado, presidia ao ensino liceal uma finalidade elitista que, no caso, era concretizada pela diferença de abordagem dos conhecimentos geológicos ministrados nos diversos ciclos de ensino. Também o tipo de assuntos abordados, o modo como eram abordados, a sua desactualização e mesmo os valores que lhes eram subjacentes, se encontravam em consonância com as características do regime português. Numa época de tão profundas mudanças na sociedade portuguesa, a Geologia, e podemos supor que o ensino das ciências em geral, não contribuiu para essa mesma mudança e nem tão pouco fez dela eco.

 Lista de teses