Associação vertical de fácies e análise de elementos arquitecturais: concepções concorrentes e complementares na caracterização de ambientes aluviais
The vertical facies succession analysis and the architectural element analysis: concurrent and complementary concepts used for the characterisation of alluvial environments

Ferreira-Júnior P.D. - Departamento de Geologia, Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, Cep 35400-000, Ouro Preto, MG, Brasil E-mail: pdias@degeo.ufop.br
Castro P.T.A. - Departamento de Geologia, Escola de Minas, Universidade Federal de Ouro Preto, Cep 35400-000, Ouro Preto, MG, Brasil E-mail:paulo@degeo.ufop.br

Introdução
Introduction

Os estudos de rochas sedimentares em afloramento sofreram um grande avanço nos últimos 30 anos, em função da sistematização e aperfeiçoamento das técnicas de descrição e da aplicação do conceito de fácies. Em particular, o reconhecimento de padrões de ocorrência de fácies em ambientes aluviais e a criação de um sistema de códigos, permitiu a agilização dos processos descritivos, optimizando a documentação dos resultados e facilitando a comunicação entre os geólogos. Por exemplo, as associações verticais de fácies têm nos perfis estratigráficos sua representação gráfica mais abrangente e significativa em termos das definições dos ambientes deposicionais, a partir dos preceitos da Lei de Walther.

Na década de 80 foi desenvolvida, principalmente por Miall (1985, 1988a), uma nova metodologia que permite a visão tridimensional dos pacotes rochosos a partir de secções aflorantes com expressiva continuidade lateral, as assim chamadas secções bidimensionais. A análise de elementos arquitecturais, denominação dada a esta última técnica, é um grande salto qualitativo que, entretanto, dá os seus primeiros passos contando com um número reduzido de trabalhos.

Tanto o estudo das sucessões verticais de fácies quanto a análise de elementos arquitecturais não são meramente descritivos. O entendimento da natureza e origem das rochas sedimentares envolve procedimentos descritivos - imprescindíveis no estabelecimento do arranjo e da distribuição de diferentes aspectos das rochas sedimentares de uma dada sequência - e procedimentos interpretativos que visam elucidar o ambiente aluvial em que se deu a sedimentação e suas condições de controlo, tais como o clima e relevo. No procedimento interpretativo, deve-se usar a analogia com modelos modernos observados directamente na natureza ou frutos de experimentação ou teorias. A busca da relação entre as acções descritivas e interpretativas é que, em última instância, norteará os métodos de análise das rochas sedimentares.

Este texto discorre sobre questões metodológicas relacionadas a aplicação da técnica de perfis estratigráficos visando estabelecer as associações verticais de fácies e a análise de elementos arquitecturais, apontando as suas vantagens e desvantagens no estudo de depósitos aluviais. Entende-se como depósitos aluviais o conjunto de fácies geradas em ambientes fluviais e em leques aluviais. O texto visa também suprir a falta de material específico que confronte os estudos de sucessão vertical de fácies e a análise de elementos arquitecturais e também as aplique em conjunto, mostrando o campo de actuação mais propício a cada um deles.

A base para a análise feita neste texto é a aplicação das duas técnicas de estudos de sistemas aluviais, por Ferreira-Júnior (1996) à Formação Uberaba, Grupo Bauru, Neocretáceo da Bacia do Paraná, Brasil. As informações pertinentes ao contexto geológico em que estão inseridas estas rochas serão abordadas no limite necessário a tornar mais claras as técnicas de análise aplicadas.

A Formação Uberaba, de abrangência restrita ao Triângulo Mineiro e pequenas porções do Alto Paranaíba, no Estado de Minas Gerais, é constituída por litoarenitos e litoarenitos feldspáticos com baixa selecção e arredondamento, com a granulometria variando de areia fina a muito grossa. Níveis conglomeráticos são comuns junto à base da Formação Uberaba (figura 1). A génese das rochas sedimentares da Formação Uberaba está associada a um sistema fluvial dominado por um complexo de canais entrançados marcados por uma alta mobilidade lateral (Ferreira-Júnior & Castro, 1998).


Análise de fácies
Facies analysis

Desde cedo, a comunidade geológica notou a necessidade de padronizar e simplificar a linguagem técnica, buscando sumariar as informações obtidas nas descrições de campo de modo a permitir a comunicação entre os geólogos e evitar a profusão de nomes e conceitos que versassem sobre um mesmo tema. A partir deste desafio, a sistematização do conhecimento geológico - após várias propostas e mudanças - convergiu para o conceito de fácies que, pode ser definido a partir da conceituação original de Gressly, em 1838, como as propriedades físicas, químicas e biológicas das rochas que, colectivamente, permitem uma descrição objectiva, como também a distinção entre rochas de diferentes tipos (Cross & Homewood, 1997). Em outras palavras, um corpo sedimentar com características específicas que o distingue de outras unidades rochosas vizinhas. O aspecto vago deste princípio é, paradoxalmente, o responsável pela sua aceitação, pois tem como vantagem principal uma liberdade de interpretação muito grande que abarca todas as subtilezas dos processos sedimentares reinantes nos diversos ambientes deposicionais

Várias são as propostas para a distinção e caracterização de uma determinada fácies. Dentre elas, destaca-se a de Selley (1978) que engloba as principais evidências possíveis de serem detectadas em campo e que envolve a litologia, grau de selecção, granulometria, estruturas sedimentares, direcção de paleocorrentes, conteúdo fossilífero e geometria do corpo. A geometria dos corpos sedimentares está relacionada, ainda que parcialmente, à topografia do ambiente deposicional, devendo-se observar se a história pós-deposicional não a alterou substancialmente. A composição mineralógica das rochas detríticas oferece informações sobre a área fonte, ao passo que a granulometria, grau de selecção e estruturas sedimentares trazem indícios sobre o transporte e a deposição, reflectindo o nível de energia e separando, naturalmente, os processos sedimentares envolvidos.

A simples definição e o reconhecimento de uma determinada fácies, porém, não são suficientes para se inferir sobre o seu ambiente de formação. Walker (1984) cita, como exemplo, uma fácies de arenito com estratificação cruzada que pode ser formada em um ambiente fluvial meandriforme ou entrançado, canal de maré ou em áreas de off-shore dominadas por correntes costeiras. É necessário, portanto, estabelecer a forma pela qual as fácies se associam e sucedem. Utiliza-se para tanto a "Lei da Correlação de Walther" (1893, apud Walker, 1984) segundo a qual, em uma sucessão vertical, uma passagem gradacional entre duas fácies sugere que elas estão associadas, tendo sido geradas em ambientes deposicionais lateralmente contíguos, ao passo que, um contacto abrupto ou erosivo pode indicar intervalos de não deposição ou mudanças significativas no ambiente deposicional.

A saída para o impasse criado pelo facto de uma mesma fácies ser gerada em ambientes diferentes é a constatação de que, em uma sucessão vertical de fácies, podem ser reconhecidas associações de fácies que, segundo Reading (1980), são um grupo de fácies que ocorre em conjunto e que pode ser relacionado genética e ambientalmente. Aplicando este princípio, Walker & Cant (1984), em um trabalho de grande minúcia, dividiram um conjunto de rochas sedimentares de origem fluvial em várias fácies, anotando as diversas passagens entre elas e definindo estatisticamente o modo como elas se sucediam. Como resultado, formularam uma sequência idealizada para a unidade depositada por canais entrançados. Segundo esses pesquisadores, a partir de uma sucessão vertical de fácies que mostre uma relação genética e ambiental é possível estabelecer o conjunto que melhor represente aquele exemplo de sistema deposicional. O estudo de vários exemplos de um dado ambiente deposicional poderá ser sintetizado em várias sucessões verticais de fácies. Os atributos mais comuns a estas sucessões de fácies poderão ser incorporados a um modelo de fácies, aprimorando, portanto, o refinamento do que é comum aos diversos exemplos de rochas formadas naqueles ambientes.

Com base nos atributos físicos tais como granulometria, textura e estruturas sedimentares, pode-se fazer inferências sobre o nível de energia e os processos sedimentares envolvidos na formação de uma dada unidade rochosa. Seguindo este raciocínio, é possível que as associações de fácies possam ser agrupadas e relacionadas a um determinado tipo ou modelo de sistema deposicional.

A aceitação do termo fácies e sua aplicação gerou o aparecimento de inúmeras definições e nomenclaturas que muitas vezes se referiam aos pacotes rochosos com características muito semelhantes. A unificação e padronização destes conceitos foi proposta por Miall (1977) que inicialmente admitiu como suficientes dez fácies para englobar os mais diversos ambientes e regimes hidrológicos existentes nos sistemas fluviais. Em uma posterior revisão, estendendo a sua utilização para todos os sistemas aluviais, Miall (1996) apresentou um conjunto de 20 fácies mais comuns (tabela 1). Seguramente este não é um número definitivo. A nomenclatura utilizada neste conjunto de fácies é constituída por duas letras: a primeira, maiúscula, indica a granulometria dominante e a segunda, minúscula, uma característica mnemónica qualquer, por exemplo, estruturas sedimentares presentes.

Comentários à codificação das fácies
Comments on facies code
Desde quando proposta, esta classificação foi aceita apesar de despertar uma série de restrições à sua extensão a todos os depósitos de origem aluvial, posto que Miall (1977) trabalhou inicialmente com sistemas fluviais entrançados modernos e antigos. Uma das principais críticas, apontada por Bridge (1993), é relativa à aplicação do sistema de códigos que levaria a uma rotineira e simples associação dos afloramentos a uma tabela preestabelecida. Com este procedimento, várias características menores, mas não menos importantes, podem vir a ser ignoradas inibindo novas observações e comprometendo uma descrição mais minuciosa e detalhada. Portanto, deve-se evitar que a observância da teoria restrinja a aquisição dos dados e ater-se, também, às pequenas variações, descrevendo-as e inserindo-as em seu contexto formador.
A linha de raciocínio actualmente adoptada é que a proposta de Miall (1977), além de prática e de fácil aplicação, atende aos princípios a que se propôs, quais sejam, agilizar e sistematizar as descrições de campo, facilitando os trabalhos de laboratórios e de documentação (tabela 2). Todavia, não se deve buscar uma aplicação directa do código de fácies e uma extensão interpretativa de seu significado, pois a validade das observações muitas vezes pode estar restrita apenas ao local em que elas se dão e a extensão, automática, destas a outras áreas nem sempre é possível. Deve-se levantar as fácies e suas associações para cada conjunto de rochas aflorantes e, a partir de uma minuciosa divisão, buscar a correlação com a classificação de Miall (1996), tendo em mente que as diferenças encontradas são frutos da própria dinâmica do meio e devem ser entendidas como uma variação peculiar ao exemplo estudado. Como cada exemplo a ser estudado possui as suas características próprias, é de se esperar que haja fácies diferentes daquelas propostas por Miall, posto ser impossível universalizar uma codificação de fácies.

Os perfis estratigráficos
Stratigraphic logs
A representação gráfica da sucessão vertical de fácies que ocorre em um afloramento é denominada perfil estratigráfico ou sedimentológico. Envolve a representação das características de um conjunto de rochas sedimentares tais como granulometria, composição mineralógica, estruturas sedimentares e conteúdo fossilífero, em uma escala de representação adequada (figura 2). Uma das maiores limitações desta técnica é, indubitavelmente, a sua perspectiva bidimensional dos pacotes rochosos, que não contempla importantes variações laterais. Como exemplo tome-se o caso de um depósito fluvial dividido, a grosso modo, em depósitos internos ao canal principal - tipicamente arenosos - e depósitos da planície de inundação - pelíticos por natureza. Em um afloramento com continuidade lateral expressiva, podem estar expostas, mesmo que parcialmente, estes dois tipos de depósitos. Dependendo de onde o perfil estratigráfico for erigido, poderá conter informações diferentes, que não contemplarão as variações laterais de fácies, levando a conclusões imprecisas. Apesar das restrições da utilização de perfis estratigráficos como representativos do acervo de fácies do afloramento ou região estudados esta técnica tornou-se uma quase rotina e seu uso foi largamente empregado a partir dos anos 70.

Os perfis estratigráficos são o método mais eficiente na descrição de testemunhos de sondagem e perfis de poços e amplamente utilizados na indústria petrolífera, pois como a natureza dos testemunhos impede a visão lateral dos pacotes rochosos, tem na associação vertical de fácies a sua representação óptima. Estes diagramas também são utilizados na correlação entre áreas geograficamente separadas empregando, muito frequentemente, perfis geofísicos como ferramenta complementar de análise. Obviamente, este procedimento leva a perda de informações, mas, dependendo da escala adoptada, pode fornecer resultados relativamente confiáveis.

A determinação do sistema deposicional é feita a partir das fácies e associações de fácies, obedecidas as premissas da lei de Walther, representadas nos perfis estratigráficos através da comparação com modelos de fácies (Walker, 1984). Neste ponto surgem algumas complicações pois a passagem da teoria para a prática apresenta algumas restrições, já que as diversas combinações possíveis entre as fácies podem ser resultado de processos deposicionais ocorridos em vários ambientes componentes de ambientes aluviais maiores. É desejável, por vezes necessário, um estudo dispendioso baseado em um criterioso levantamento estatístico, que permita elaborar uma sequência vertical de fácies representativa do comportamento geral das rochas estudadas naquela secção, como apresentado por Walker (1984) (figura 3).

As observações de modelos modernos e antigos mostram que algumas associações verticais de fácies, que apresentam um significado genético distinto, são comuns a diversos regimes fluviais, como por exemplo nos depósitos desenvolvidos nas barras em ponta e em barras longitudinais. A rigor são formados por uma mesma associação de fácies arenosas, diferindo na forma como se desenvolvem a partir da migração das formas de leito, se lateral ou para jusante no canal principal. Ainda para estes depósitos, sabe-se que eles são comuns tanto em ambientes meandriformes quanto nos entrançados e, mesmo uma barra longitudinal (uma forma de leito de acreção a jusante, sob o enfoque utilizado no método de análise de elementos arquitecturais), frequentemente evocada como uma feição diagnóstica dos canais entrançados pode apresentar, durante o seu desenvolvimento migração lateral (Miall, 1994), o que, em tese, seria típico das barras em ponta dos modelos de rios meandriformes. Estes factos mostram as limitações inerentes aos métodos que subestimam variações locais que, apesar da sua magnitude ser limitada, podem ser de grande significado geológico. Além disso, para uma perfeita caracterização, deve-se fazer um levantamento estatístico dos tipos e frequência das transições entre as fácies, procedimento que trás consigo complicações técnicas óbvias.


Análise de elementos arquitecturais
The architectural element analysis

Visando suprimir os problemas decorrentes do empilhamento vertical de fácies, vários pesquisadores trabalharam na caracterização dos depósitos aluviais, buscando o reconhecimento das diferentes associações de fácies, fruto de diversos padrões de distribuição energética em um dado ambiente deposicional (canal, por exemplo). Uma feição comum a todos depósitos sedimentares e que, frequentemente, é desprezada ou sub-utilizada é o rico acervo de superfícies de descontinuidades que separam as fácies e as associações de fácies. Na técnica que utiliza a sucessão vertical de fácies, as superfícies de descontinuidade são entendidas como possíveis limites entre fácies ou associação de fácies não existindo uma preocupação adicional com o seu intrincado arranjo lateral.

O trabalho de Allen (1983) foi pioneiro em utilizar as superfícies de separação de sets (feixe) e cosets (conjunto de feixes) conjuntamente às fácies presentes em um depósito aluvial como base de estudo. Nesta oportunidade mostrou que as superfícies podem ser ordenadas hierarquicamente de acordo com a magnitude dos processos deposicionais e que superfícies de mesma ordem hierárquica separam pacotes sedimentares com características genéticas afins. Haszeldine (1983) também se ocupou com este tema.

A partir destes princípios, Miall (1985) propôs uma nova forma de análise e codificação da terminologia descritiva dos depósitos aluviais, denominada de Método de Análise de Elementos Arquitecturais. O princípio fundamental desta técnica incide na identificação de superfícies de descontinuidades físicas que subdividem uma sequência aluvial em pacotes geneticamente relacionados e hierarquicamente estruturados, conhecidos como elementos arquitecturais e macroformas (ver no item referente a relação entre elementos arquitecturais e macroformas).

A principal vantagem deste método está na visão tridimensional dos depósitos obtida a partir de secções aflorantes bidimensionais com várias direcções de acreção deduzidas e, por conseguinte, na determinação da geometria dos corpos sedimentares. As aplicações são inúmeras, principalmente, no que tange a utilização económica de recursos minerais encerrados nestas unidades (Ferreira-Júnior et al., 1995). O reconhecimento de pequenas variações nas características intrínsecas do meio, por exemplo, direcção de crescimento das formas de leito e nas grandes feições deposicionais (e.g. barras) também, é uma das vantagens do método. As informações são mais detalhadas, permitindo individualizar cada depósito e estabelecer as suas relações de contacto com os demais corpos sedimentares (figura 4).

Em arenitos fluviais da Formação Rio Vero (Espanha) estudados por Jones et al. (2001), movimentos tectónicos e mudanças climáticas sazonais afectaram a evolução lateral e vertical de, sendo responsáveis pelo controle principal da sedimentação e com consequências sobre a arquitectura fluvial. A mudança na arquitectura fluvial com a passagem de depósitos típicos de preenchimento de canal compostos de campos de dunas e barras simples junto à base para numerosas barras de meio de canal com suas superfícies de acreção para o topo, sugerem um aumento da energia e do suprimento de sedimentos.

Superfícies de descontinuidade e sua hierarquia
Discontinuity surfaces and their hierarchy
Entende-se como superfície de descontinuidade física uma interrupção ou mudança no processo de sedimentação. Esta superfície pode ser também gerada através de processos erosivos, podendo ter implicações temporais. Tentativas de estabelecimento de uma hierarquização dessas superfícies tem sido feitas, por exemplo, Allen (1983) e Haszeldine (1983). Miall (1988a), apontou três princípios para a hierarquização das superfícies de descontinuidade:

a) uma dada superfície pode ser truncada por outra de igual ou maior ordem, mas nunca por uma de ordem inferior;
b) na definição de uma dada superfície deve-se tomar, como base, uma superfície de maior ordem hierárquica;
c) superfícies de baixa ordem podem aumentar de ordem lateralmente.

A prática, entretanto, mostra que, para maior confiabilidade no estabelecimento desta hierarquia em afloramentos, a definição das superfícies hierárquicas deve começar sempre com aquelas de menor ordem, as quais mostram contactos abruptos e são frequentemente truncadas por outras de maior ordem. A partir das superfícies menores, mais fáceis e seguras de serem classificadas, vai-se estruturando a hierarquia das superfícies de descontinuidade nos afloramentos, até a definição das superfícies de maior ordem. Portanto, por mais enfadonho que possa parecer, é imprescindível traçar e classificar todas as superfícies de 1ª e 2ª ordem que servirão de base para a definição daquelas de maior ordem e que trazem considerações mais importantes à interpretação dos depósitos (ver a hierarquia das superfícies na tabela 3). Somente assim pode-se estabelecer, com precisão, o limite entre os elementos arquitecturais. A dificuldade de determinação das superfícies de menor ordem é a responsável pelos problemas encontrados para a extensão deste método aos depósitos conglomeráticos, por exemplo, Barbosa (1997), onde as superfícies de baixa ordem (1ª e 2ª ordem) são muito difíceis de serem identificadas devido à textura destas rochas que tende a mascarar as menores descontinuidades físicas. Com isso, podem pairar dúvidas sobre a classificação e o limite de uma dada superfície de 3ª ou maior ordem e, consequentemente, sobre as dimensões do próprio depósito.

As superfícies de descontinuidade podem ser divididas em oito ordens hierárquicas (figura 5), segundo a proposta de Miall (1988a; 1988b; 1996) e mostradas na tabela 3.

Algumas variantes ou características peculiares foram anotadas na Formação Uberaba e ajudam na distinção destes limites de descontinuidades. Os dados foram levantados em 9 secções aflorantes, analisadas sob a óptica do método dos elementos arquitecturais por Ferreira-Júnior (1996).

1ª Ordem: Limita sets de estratos cruzados de mesma espécie com pouca ou nenhuma erosão interna. São o instrumento básico de hierarquização e devem ser traçadas tantas quanto forem possíveis.

2ª Ordem: Limita cosets (McKee & Weir, 1953), indicando mudanças na direcção ou no regime do fluxo, como um aumento ou diminuição do volume aquoso, mas sem que haja uma parada significativa da sedimentação. Na prática, apresenta uma grande similaridade com as superfícies de 3ª ordem, sendo a distinção entre ambas feita através das suas dimensões (tabela 4), do carácter erosivo (bem marcado nas de 3ª ordem) e, principalmente, das relações de contacto com as outras superfícies. Na Formação Uberaba ocorrem sob dois tipos:

3ª Ordem: trata-se de uma superfície cuja origem é erosiva e separa associações similares de fácies tendo comumente associada a presença de intraclastos e seixos. Possui uma alta variação no ângulo de inclinação (0° a 23°). Na Formação Uberaba é dividida em três tipos de acordo com suas características (forma, extensão e relações de truncamento com as feições preexistentes):

4ª Ordem: com forma plana a convexa para cima, estas superfícies separam associação de fácies com orientações diferentes, definindo o limite superior das macroformas. Bastante extensas (16 a 114 metros de comprimento), cortam quase todo o afloramento, tendo na convexidade para cima um dos principais critérios de identificação. Limita macroformas com 80 a 360 cm de espessura e tem inclinação variando entre 0° e 14°, ficando a média em torno de 3°. Quando recobrem pequenos canais (limitados por superfícies de 3ª ordem) que cortam o topo das macroformas são normalmente planas.
Outra característica que permite a divisão entre superfícies de 3ª e 4ª ordem, é o frequente truncamento que fazem as superfícies de 3ª ordem entre si, quando comparados às de 4ª ordem.

5ª Ordem: bem marcada por estruturas de corte e preenchimento, que apresentam estratos conglomeráticos residuais com espessura em torno de 5 cm. Esta superfície limita complexos de preenchimento de canais. Apresenta ligeira concavidade para cima (no máximo 6°) e uma grande consistência lateral estendendo-se, em geral, por todo o afloramento. Na Formação Uberaba não foram observados truncamentos entre superfícies de 5ª ordem, que encerram sequências cuja espessura variam entre 160 e 500 cm.

6ª Ordem: define unidades litoestratigráficas cartografáveis, tais como membros.

7ª Ordem: separa eventos alogênicos de várias origens, tais como tectónicos ou eustáticos.

8ª Ordem: marca descontinuidades regionais desenvolvidas por eventos geológicos globais.

As superfícies de 7ª e 8ª ordem foram apresentadas por Miall (1996) em um esforço de contextualizar os elementos arquitecturais em uma escala global dos eventos geológicos. As superfícies hierárquicas de maior ordem são difíceis de serem delimitadas em afloramentos (Keighley & Pickerill, 1996), sendo necessária a utilização de análises complementares. Quando as condições do afloramentos e as particularidades geológicas permitirem deve-se registrá-las e definir suas características aumentando o acervo das informações.

Análise das direções de paleocorrentes e das direções de acreção das superfícies hierárquicas
Paleocurrents analysis and the hierarchy surface accretion’s direction
As medidas de paleocorrentes são essenciais ao método, pois elas dão a direcção de crescimento das formas de leito que se desenvolvem em estreita relação com as macroformas. A relação entre a direcção de crescimento das formas de leito e a geometria das superfícies de descontinuidade de 3ª e 4ª ordens, componentes e definidoras das macroformas, é que possibilita a compreensão, em três dimensões, do contorno externo (morfologia) e da direcção de desenvolvimento da macroforma.

Ponto ainda polémico, a determinação da direcção de paleocorrentes não apresenta um consenso na literatura especializada. Autores divergem quanto ao uso de paleocorrentes locais e regionais. Miall (1994) sugeriu o uso da direcção regional do fluxo que é dada pela análise conjunta de medidas tomadas em estratos cruzados de um mesmo pacote sedimentar que pode englobar vários elementos arquitecturais e macroformas. Este procedimento, utilizado por Miall & Turner-Peterson (1989) e Stephens (1991), visa absorver variações locais do fluxo (leia-se maior sinuosidade), preservando apenas a direcção geral, que representa a tendência por um longo período de tempo.

Durante a análise da Formação Uberaba (Ferreira-Júnior, 1996), optou-se pelo uso das paleocorrentes locais pois, as macroformas têm suas características regidas, dentre outros, pelo estilo fluvial vigente à época de sua deposição, sendo a sinuosidade do canal um dos mais importantes factores (Friend, 1983). O uso de paleocorrentes locais dão informações mais precisas sobre o fluxo e, consequentemente, a sua relação com a direcção de crescimento da macroforma é pontual. Paleocorrentes locais foram utilizadas por Cowan (1991), Bromley (1991), Wizevich (1992) e Castro (1994).

As medidas de paleocorrente devem ser tomadas, sempre que possível, em estratos cruzados tabulares pois estas estruturas são formadas durante o crescimentos das macroformas. Deve-se ter cuidado com a utilização de estratificações cruzadas acanaladas pois estas, quando presentes sobre ou nas macroformas, demonstram e dão direcções de pequenos canais que cortam eventualmente as macroformas. Entretanto, para o caso da Formação Uberaba, utilizaram-se de outros indicadores de paleocorrente como estratos cruzados acanalados e seixos imbricados, pois a identificação de estratos cruzados tabulares foi pouco frequente. Este facto possibilitou uma maior consistência estatística dos dados, mas por outro lado aumentou a dispersão entre as medidas de paleocorrentes.

O tamanho das macroformas e elementos arquitecturais é outro parâmetro a ser considerado na utilização da técnica de elementos arquitecturais. As dimensões das macroformas, apresentadas por Miall (1988a), excedem em muito as da Formação Uberaba, principalmente no que diz respeito à espessura (tabela 5). Este pode ser o motivo pelo qual o referido autor prefira usar medidas regionais de paleocorrente, que registram o comportamento médio do fluxo durante um longo intervalo.

A dinâmica do ambiente aluvial da Formação Uberaba, aliada à pequena preservação de seus depósitos foi um complicador da aplicação da análise de elementos arquitecturais, pois as macroformas geradas neste ambiente deposicional apresentam uma alta razão largura/espessura. Este facto, conjuntamente à grande mobilidade dos canais (responsável pelo baixo potencial de preservação), geraram depósitos pouco espessos onde é comum a presença de várias superfícies hierárquicas de ordem elevada (3ª, 4ª e 5ª ordem), que frequentemente se interceptam (Friend et al., 1979; Miall, 1988a; Schumm, 1993).

A direcção de acreção dos elementos arquitecturais e macroformas é tomada em superfícies hierárquicas (1ª e 2ª ordem) internas aos elementos arquitecturais e também naquelas externas que definem a geometria do pacotes sedimentares (3ª e 4ª ordem). Estas superfícies nem sempre são fáceis de serem medidas, pois apresentam-se relativamente planas exigindo cuidados suplementares na sua leitura.

Uma característica peculiar deste método é o baixo número de medidas utilizadas para definir a atitude das superfícies hierárquicas. Para a Formação Uberaba, este número variou entre 3 e 35 medidas e o mesmo se verificou nas demais publicações pesquisadas. Este facto se deve ao próprio conceito do método, segundo o qual uma superfície hierárquica delimita um pacote sedimentar individual. Como não ocorre uma pluralidade de superfícies, para cada elemento arquitectural, o número de medidas deverá ser reduzido, daí a exigência de medidas pontuais cuidadosamente tomadas, pois pequenos erros de leitura podem levar a resultados díspares.

Depósitos e feições utilizadas na análise de elementos arquitecturais
Deposits and aspects used in architectural element analysis
A classificação dos elementos arquitecturais, que certamente não é definitiva, conta actualmente com 9 unidades básicas, definidas em associações de fácies, codificadas segundo Miall (1978) e incluem canais, barras conglomeráticas, depósitos de fluxo de gravidade, formas de leito arenosas, camadas de arenito laminado, depósitos de finos da planície de inundação, macroformas de acreção a jusante, macroformas de acreção lateral e hollows (
figura 6). A despeito dos estudos desenvolvidos em análise de elementos arquitecturais por Miall, há que se apontar imprecisões em sua classificação dos elementos. Uma discussão pormenorizada deste assunto foge ao escopo deste texto. Neste estudo, recomendam-se a separação entre os elementos arquitecturais básicos, macroformas (de acreção a jusante e de acreção lateral) e canais.

Elementos arquitecturais
Architectural elements

BARRAS CONGLOMERÁTICAS (GB - GRAVELLY BARS AND BEDFORMS)
Podem ser definidas como corpos tabulares originados da migração de barras longitudinais ou transversais formadas por fragmentos da granulometria superior à areia (fácies Gm, Gp e Gt, segundo proposta de Miall, 1996). Formam lençóis de dezenas a centenas de metros de extensão, frequentemente recortados por superfícies erosivas ou irregulares de 2ª ordem.

DEPÓSITOS DE FLUXO DE GRAVIDADE (SG - SEDIMENT GRAVITY FLOW DEPOSITS)
Depósitos formados por processos de fluxo de detritos e frequentemente intercalados ao elemento barras conglomeráticas (GB). Apresentam como fácies características aquela formadas por clastos, principalmente de granulometria acima de grânulos com matriz argilosa. Tem geometria de lóbulos alongados ou de lençóis (fácies Gmm, Gmg, Gci e Gcm). A espessura de cada elemento varia de 0,5 a 3 m. A superfícies basal é irregular, mas não erosiva, sendo essa irregularidade proveniente do paleo-relevo.

FORMAS DE LEITO ARENOSAS (SB - SANDY BEDFORMS)
Comuns em sistemas aluviais arenosos, onde a combinação das fácies St, Sp, Sh, Sl, Sr, Se e Sh (segundo o código proposto por Miall, 1978) formam elementos arquitecturais com uma alta variedade geométrica. Elementos arquitecturais apresentando geometria tabular ocorrem na base dos canais, no topo das macroformas ou formando depósitos de crevasse splay (depósitos de ruptura de diques marginais aos canais). Não apresentam superfícies internas de 3ª ordem.

CAMADA DE ARENITO LAMINADO (LS - LAMINATED SAND SHEET)
Variedade de formas de leito arenosas (SB) dominada pelas fácies Sh e Sl. Esta associação de fácies indica regime de fluxo superior comum em rios efémeros (Tunbridge, 1981). De geometria tabular, a espessura individual de cada um desses elementos varia de 0,4 a 2,5 m, com extensão lateral que pode alcançar mais de 100 m.

DEPÓSITOS DE FINOS DE PLANÍCIE DE INUNDAÇÃO (OF - OVERBANK FINES)
Constituído por argilitos, siltitos e arenitos finos (fácies Fm e Fl) depositados na planícies de inundação (geometria em lençol, reflectindo acreção vertical) ou em canais abandonados (contacto basal côncavo para cima e geometria em cordão). Paleossolos, carvão, evaporitos e depósitos lacustres também são componentes deste elemento.

HOLLOW (HO)
Introduzido por Cowan (1991), este elemento pode ser confundido com pequenos canais devido à sua forma erosiva côncava para cima. No entanto, não tratam-se de canais diferindo destes por serem limitados por superfícies de 4ª ordem. O seu preenchimento típico é formado por fácies conglomeráticas na base (fácies Gh e Gt) e arenosas no topo (fácies St e Sl). A sua formação ainda é controversa, acreditando-se que seja gerado por processos de escavação (scouring) profundos no ponto de convergência dos canais.

Macroformas
Macroforms

MACROFORMA DE ACREÇÃO A JUSANTE (DA - DOWNSTREAM ACCRETION MACROFORMS)
Definida por Miall (1988b), esta macroforma normalmente é formada por elementos arquitecturais similares às formas de leito arenosas (SB). Em geral, esta macroforma é constituída pelas fácies arenosas. Por vezes pode-se confundir esta macroforma com os elementos arquitecturais básicos, mas a distinção entre eles se dá pela presença de várias superfícies internas de 3ª ordem e o limite superior (de 4ª ordem) normalmente convexo para cima na macroforma. A direcção de mergulho das superfícies hierárquicas (1ª, 2ª e 3ª ordem) é paralela ou subparalela à direcção principal do fluxo, dada por medidas de paleocorrentes tomadas nos estratos cruzados, indicando que o crescimento desta unidade se deu para jusante (figura 7).

A partir da análise arquitetural e do predomínio da macroforma DA sobre a macroforma LA, Keighley & Pickerill (1996) atribuíram a deposição dos arenitos da Formação Port Hood (Canadá) a um sistema de baixa sinuosidade com canais entrançados. Com base na análise de fácies e sucessão vertical de fácies, autores como Gersib & McCabe (1981) apontaram um sistema fluvial meandriforme como o responsável pela deposição da referida unidade.
Halfar et al. (1998) utilizaram o predomínio da macroforma LA sobre a macroforma DA para classificar um sistema fluvial da bacia de Weisselster (Alemanha) como meandriforme.

DEPÓSITOS DE ACREÇÃO LATERAL (LA - LATERAL ACCRETION MACROFORMS)
Tipo de macroforma de acreção na qual a orientação da direcção de desenvolvimento das superfícies limítrofes se dá em alto ângulo com a direcção de paleocorrente. Isto sugere um desenvolvimento lateral da macroforma (figura 7). Normalmente é formada por associações de fácies arenosas.
A distinção entre as macroformas LA e DA é muito difícil, uma vez que elas podem fazer parte de uma mesma barra e apresentarem as mesmas litologias. A separação é feita com base na orientação das superfícies de acreção, como sugerido por Miall (1994) e aplicado, dentre outros, por Ferreira-Júnior (1996) e Jones et al. (2001).
Naturalmente as macroformas DA e LA tratam-se de estereótipos, sendo mais frequente a existência de macroformas que cresçam tanto para jusante como lateralmente. O que mais importa no contexto é a preponderância de uma delas para efeito dos estudos e classificação dos sistemas aluviais. Desta forma, sistemas aluviais que apresentem predomínio de macroformas DA podem ser classificados como sistemas do tipo entrançado.

Canais
Channels

CANAIS (CH - CHANNELS)
Limitados, na base, por superfícies planas ou côncavas para cima, ocorrem nas mais variadas dimensões e em qualquer sistema aluvial. A principal característica desse elemento é a base erosiva côncava para cima. Entretanto, quando se analisa um grande canal dificilmente observa-se as suas margens, verificando-se apenas uma ligeira inclinação da superfície basal, o que praticamente impossibilita a definição dos limites laterais desse elemento. Portanto, a definição dessa unidade, em depósitos aluviais, vai depender da habilidade de reconhecer e traçar as superfícies limítrofes de suas margens. Onde isso não for possível, deve-se classificar a seção sedimentar em foco em termos dos outros elementos arquitecturais presentes.

Halfar et al. (1998) dividiram o elemento CH em dois tipos básicos de acordo com as dimensões dos depósitos. Os maiores canais, que possuem de centenas de metros até 10 km de largura, são preenchidos pelos demais elementos arquitecturais e macroformas, apresentando registro de migração lateral. Os pequenos canais possuem de 10 a 100 m de largura e são caracterizados pela forma côncava típica, sem evidências de migração lateral.

Devido às diferentes dimensões, várias são as classificações adoptadas para os canais. Neste trabalho será adoptada a classificação de Bristow (1987) para o rio Brahmaputra em Bangladesh.

O elemento CH apresenta algumas particularidades em relação aos demais elementos arquitecturais, pois é o único caracterizado por processos claramente destrutivos, responsáveis pela erosão parcial e retrabalhamento do topo das formas de leito depositadas durante períodos de alta dos rios. Apesar de evidências internas de descontinuidade na sedimentação, representadas pelas superfícies de 2ª e 3ª ordens, os demais elementos arquitecturais são caracterizados por processos francamente construtivos, traduzidos pelas diversas superfícies internas que denotem acreção. O seu preenchimento é variado.

Formas de leito, elementos arquitecturais e macroformas
Bedforms, architectural elements and macroforms
A técnica de análise de elementos arquiteturais é baseada em modelos que buscam uma aproximação com a realidade verificada em campo, o que nem sempre é possível. Neste caso deve-se reconhecer as limitações do método buscando o seu aperfeiçoamento (Keighley & Pickerill, 1996; Bridge 1993).

Assim como aconteceu com o código de fácies inicialmente proposto por Miall (1977; 1978), os oito elementos arquitecturais, tais quais definidos Miall (1985), não parecem abranger a totalidade dos depósitos aluviais existentes. Várias são as causas desta constatação:

a - as particularidades de cada bacia sedimentar, no que concerne a sua evolução e variações climáticas, provocam variações significativas nos processos sedimentares;
b - um outro aspecto a ser levantado reside no facto de que Miall, ao inicialmente definir os elementos arquitecturais, o fez utilizando como objecto de estudo os depósitos aluviais arenosos em detrimento dos depósitos rudíticos e lutíticos. Deste modo, a extensão sugerida pelo autor aos demais depósitos aluviais (proximais e distais) torna-se algo inconsistente, apontando para futuras revisões.

Na própria literatura especializada, frequentemente encontramos confusões com a nomenclatura a ser adoptada. Vários são os autores que usam indevidamente os termos elementos arquitecturais e macroformas. Esta não é apenas uma questão semântica, posto envolver aspectos referentes à génese e à complexidade dos depósitos. Do mesmo modo que autores como Allen (1983), Haszeldine (1983) e Miall (1985) reconheceram uma hierarquia ao estudar as superfícies de descontinuidade, há que se reconhecer um ordenamento ou hierarquia nos depósitos sedimentares encerrados pelas superfícies de descontinuidade.

A fim de se evitar confusões com a terminologia empregada devem ser feitas algumas considerações sobre elementos arquitecturais e macroformas. Apesar de não haver um consenso na comunidade geológica sobre a correcta definição destes termos, podem-se levantar alguns aspectos gerais que possibilitam a sua melhor utilização. Ambos os termos referem-se a depósitos sedimentares de origem aluvial, constituídos por fácies relacionadas geneticamente e delimitadas por superfícies de descontinuidade.

Elementos arquitecturais são gerados por eventos periódicos, dinâmicos e individuais. Como consequência, os pacotes definidos como elementos arquitecturais não apresentam superfícies internas de 3ª ordem, resultantes de reactivações de longa escala ou mesmo de mudanças significativas na direcção de desenvolvimento dos elementos. Os elementos arquitecturais podem ser associados às mesoformas de Jackson (1975). São elementos arquitecturais a seguintes unidades, segundo Miall (1996): CH, GB, SG, SB, LS, HO e OF. Halfar et al. (1998) acrescentam o elemento SL (shallow lake deposits) à classificação de Miall (1985) quando analisaram depósitos de canais meandriformes. Este elemento consiste em lentes de argila finamente laminada, lateralmente descontínuas, depositadas em lagos adjacentes a canais activos.

Por outro lado, as macroformas (sensu Jackson, 1975), são depósitos complexos, compostos em geral, pelo fruto da acção de mais de um evento deposicional, ou seja: são compostos por elementos arquitecturais. Como consequência, são observadas várias superfícies de 3ª ordem, indicativas do efeito cumulativo de vários eventos periódicos, dinâmicos e individuais. Assim, os elementos arquitecturais são delimitados por superfícies de 3a ordem, ao passo que as macroformas são por superfícies de 4ª ordem. São macroformas as unidades LA e DA de Miall (1988a).

Neste ponto, é interessante fazer uma relação entre a terminologia empregada por Miall e as terminologias usadas rotineiramente na literatura sedimentológica, posto haver uma relação íntima entre as migrações das formas de leito e os elementos arquitecturais. A terminologia empregada neste texto segue a decisão do Simpósio Internacional “Classification of Large-Scale Flow Transverse Bedforms” (Ashley, 1990), que propôs uma classificação objectiva para as formas de leito desenvolvidas em sistemas aluviais, de intermaré e marinhos, baseada exclusivamente na descrição morfológica. Segundo Ashley (1990), todas as formas de leito são dunas (tabela 6), pois a despeito dos variados ambientes deposicionais, elas apresentam um processo de formação similar devendo, portanto, ter a mesma denominação. De acordo com a energia do meio, as dunas podem ser subdivididas em dois grupos: bidimensionais (2D) ou tridimensionais (3D), que requerem uma velocidade de fluxo compatível com o regime de fluxo inferior (Middleton & Southward, 1986).

Observações sobre o elemento CH
Comments on CH element
A analogia entre depósitos de canais da Formação Uberaba e ambientes modernos foi feita utilizando-se do rio Brahmaputra, em Bangladesh, onde complexos de canais foram caracterizados e hierarquizados por Bristow (1987), que mostrou as suas relações com as formas de leito e o registro sedimentar que os preenchem (figura 8).

Uma das questões mais importantes do processo descritivo relaciona-se às dimensões dos ambientes, uma vez que os rios e seus produtos deposicionais variam enormemente de tamanho. Bristow & Best (1993) mostraram uma grande similaridade entre os depósitos fluviais de diferentes dimensões, o que em parte é devido ao facto de que os mesmos princípios físicos governam o regime hidráulico, independentemente da magnitude do fluxo aquoso. A determinação das dimensões de um antigo canal fluvial ainda dá os seus primeiros passos (Bristow, 1987). Esta determinação se dá a partir da relação entre as dimensões canal e as das formas de leito (macroformas e elementos arquitecturais), estas últimas sendo obtidas dos registros sedimentares. Não há ainda um método que aponte com segurança a relação entre o que foi preservado no registro sedimentar e a largura e a profundidade de um rio.

O canal de 1ª ordem (Bristow, 1987), compreende o rio principal que migra lateralmente dentro de uma extensa área denominada cinturão de canais (channel belt). Podem ocorrer vários outros canais de menor grau hierárquico dentro do canal principal. Os depósitos formados pela migração lateral dos canais de 1ª ordem são delimitados na base e no topo por superfícies que correspondem às de 5ª ordem (figura 8a). A geometria destes depósitos arenosos produzidos pela sedimentação fluvial vai depender da forma como os canais de 1ª ordem migram. Um movimento lateral e contínuo resultará em extensas camadas arenosas, ao passo que movimentos avulsivos bruscos geram uma geometria em cordão (Friend et al., 1979).

Os canais de 2ª ordem são aqueles internos ao canal principal (de 1ª ordem) e delimitam e determinam as feições das macroformas. A migração lateral dos canais de 2ª ordem é responsável pela geometria externa das macroformas. As características e o padrão desses canais são mantidas durante os estágios de cheia e baixa dos rios. As figura 8b e 8c mostram de forma esquemática, a partir do trabalho de Bristow (1987), as relações entre os depósitos de preenchimento de canais de 2ª ordem e as macroformas. As inúmeras superfícies de 3ª ordem marcam oscilações do fluxo durante os períodos de cheia e baixa dos rios.

Os canais de 3ª ordem de Bristow (1987) recortam o topo das macroformas em um processo tipicamente destrutivo. São mais activos nos períodos de queda das cheias, quando as águas começam a retornar ao seu leito normal e são observados, indiferentemente, em cursos meandriformes e entrançados. Esses pequenos canais são produzidos no topo das macroformas recortando-as irregularmente e produzindo mudanças locais na direcção do fluxo (Coleman, 1969). A característica marcante dos depósitos gerados por esses pequenos canais é a base francamente erosiva e côncava para cima dada por superfícies de 3ª ordem. Como dissecam o topo das macroformas, o limite superior dos canais de 3ª ordem é uma superfície de 4ª ordem, que delimita essas formas de leito.

A figura 9 apresenta um fotomosaico e a interpretação de uma secção aflorante analisada segundo a técnica de elementos arquitecturais bem como a identificação de fácies. A figura 10 mostra uma representação das condições ambientais vigentes à época da deposição dos sedimentos, ou seja um contexto onde se encaixa a secção apresentada na figura 9, que se encontra destacada. O elemento 1-CH (figura 9) é formado pelo preenchimento de um canal de 2ª ordem de Bristow (1987), que conta com diversas superfícies erosivas de 1ª, 2ª e 3ª ordens. O elemento arquitectural 1B-GB desenvolveu-se em uma porção de maior energia no interior deste canal, sendo caracterizado por sedimentos grossos na fracção granulométrica seixo (fácies Ce). A figura 9b apresenta o perfil vertical de fácies dos afloramentos onde foi realizada a análise arquitectural da secção Santa Rosa.

Comentários e recomendações à análise dos elementos arquitecturais
Some comments and recommendations on architectural element analysis
Assim, como ocorreu com o código de fácies, a aplicação e extensão dos elementos arquitecturais aos trabalhos de campo, se depara com complicações decorrentes da grande variedade de depósitos do ambiente aluvial. A própria definição do termo nos dá uma ideia desta dificuldade: “um elemento arquitectural é definido como um componente de um sistema deposicional - menor ou equivalente, em tamanho, a um preenchimento de canal, e maior que uma unidade individual de fácies - caracterizado por uma associação distinta de fácies, geometria interna e forma externa, sendo limitado por superfícies hierárquicas de terceira ou quarta ordem” (Miall, 1996). Novamente uma definição ampla que contempla as mais diversas possibilidades, tanto em termos descritivos quanto interpretativos.

Miall (1985), com base em um sistema fluvial entrançado, sugeriu 8 elementos arquitecturais básicos e Cowan (1991) definiu um novo elemento, por sua vez referendado por Miall (1996). Os depósitos de finos da planície de inundação receberam atenção especial e apresentam uma classificação própria (Miall, 1996). Divisões dos elementos originais foram apresentadas por Lang (1993), mostrando a variedade dos sistemas deposicionais e a dificuldade de se encerrar em um código as variabilidades do mundo físico.
A solução para as dificuldades na utilização da técnica de elementos arquitecturais é a adaptação da classificação a cada situação de campo. Deve-se respeitar, entretanto, os princípios básicos do método na definição dos elementos arquitecturais e, se necessário, elaborar uma classificação e codificação própria. Este procedimento deve ser justificado pelas características peculiares dos afloramentos. Por último, correlacionar, se possível, os elementos arquitecturais propostos com aqueles definidos pela literatura destacando as diferenças encontradas e evitando, assim, a proliferação de códigos e confusões desnecessárias.

Os procedimentos padrões à análise de elementos arquitecturais podem ser divididos em etapas sucessivas e complementares abaixo listadas. Parte destas informações diz respeito a procedimentos metodológicos recolhidos nas mais diversas publicações que versam sobre este tema. Outra parcela relaciona-se à experiência adquirida durante a aplicação deste método à Formação Uberaba (Ferreira-Júnior, 1996).

1. Escolha de afloramentos regulares com boa extensão lateral, facilidade de acesso e litótipos bem preservados. Afloramentos com estas características normalmente são encontrados em cortes de ferrovias e de rodovias. As dimensões dos afloramentos são um importante item a ser considerado, pois remetem directamente à questão da escala de observação adoptada. Como a base deste método é a identificação e hierarquização das superfícies de descontinuidade é necessário que se possa observar aquelas de menor ordem hierárquica (1ª e 2ª ordem), pois, é a partir delas que se estabelecem as demais ordens. A classificação deverá ser ascendente e não descendente. Ora, se estas superfícies serão traçadas sobre um fotomosaico, as fotografias que o compõem devem apresentar suficientes detalhes para a melhor delimitação das superfícies de menor ordem. Isto significa que com uma máquina fotográfica equipada com uma objectiva de 50mm uma distância superior, por exemplo, a 15 m entre o afloramento e o fotógrafo trará dificuldades de identificação de superfícies de 1ª e 2ª ordens, diminuindo a fiabilidade nos dados.
Afloramentos de grande altura e/ou afloramentos muito irregulares, são problemáticos, pois elaborar fotomosaicos com a superposição lateral e superior de fotografias acarreta distorções difíceis de serem contornadas, com prejuízos à documentação dos trabalhos. Métodos de correcção destas distorções já estão disponíveis mas requerem a presença de topógrafos e softwares específicos o que, actualmente, inviabiliza ou dificulta a sua aplicação.
A espessura dos afloramentos pode trazer complicações relativas ao acesso a todos os pacotes rochosos, impossibilitando a tomada de medidas de paleocorrentes e das medidas da direcção do mergulho das superfícies de descontinuidade, dificultando a definição dos elementos arquitecturais. Como visto anteriormente, a tomada de medidas de paleocorrentes e atitude das superfícies de descontinuidade deve ser pontual e dela depende o sucesso da análise arquitectural.
A situação ideal, portanto, são afloramentos de espessura métrica com grande extensão lateral (dezenas a centenas de metros), onde a passagem lateral das fácies e suas associações permitam o empilhamento vertical dos elementos arquitecturais, em ordem cronológica, e uma ampla visão da sucessão estratigráfica.

2. Documentação fotográfica com a construção de um fotomosaico. As fotos devem ser tiradas a uma distância compatível à individualização, nas fotos, das superfícies de 1ª e 2ª ordens. É importante ressaltar o problema da escala. Durante a aplicação desta metodologia aos arenitos fluviais da Formação Uberaba, onde a espessura dos sets e cosets é bastante reduzida (de 10 cm a 50 cm, em média), não se pode fotografar os afloramentos de uma distância maior sem se perder a qualidade. Se, por outro lado, a análise tomar como base arenitos eólicos, com sets e cosets reconhecidamente mais espessos, as distâncias poderão ser maiores sem que haja perdas significativas da qualidade do fotomosaico.
Fotos coloridas se mostram mais adequadas à esta técnica, auxiliando na separação das fácies. As fotos devem ser tiradas sempre a uma mesma distância dos afloramentos, daí a exigência de afloramentos sem grandes irregularidades que comprometam a escala de observação.
Na superposição lateral das fotos deve-se corrigir sempre as distorções buscando uma aproximação do mosaico com a realidade verificada em campo. Para isso recomenda-se que, inicialmente, todo o afloramento seja registrado com poucas fotos que servirão de guias para a montagem do fotomosaico. Caso não seja feita a correcção das distorções, o fotomosaico terá um aspecto curvo, pois como a parte de cima das fotos, devido à altura dos afloramentos, está a uma maior distância do fotógrafo, apresentará um menor tamanho em relação à parte de baixo da foto. Uma simples superposição de imagens gerará uma curvatura artificial ao afloramento.

3. Análise preliminar das superfícies de descontinuidade. Ainda nesta etapa de campo, deve-se fazer um croqui com as principais fácies e superfícies de descontinuidade, certificando-se das suas relações de contacto. Este procedimento será útil na individualização de pacotes rochosos nas etapas de laboratório. A descrição das principais fácies associada a uma hierarquização preliminar das superfícies de descontinuidade permite uma interpretação inicial dos elementos arquitecturais que, entretanto, só estará completa com as medidas de paleocorrentes de atitudes das superfícies de descontinuidade, em uma etapa posterior de campo.

4. Hierarquização das superfícies de descontinuidade. Após a montagem do fotomosaico, levantar todas as superfícies possíveis, respeitando as suas relações de contacto. Este procedimento é feito em um transparente (overlay) sobreposto ao fotomosáico, onde são registradas as superfícies de descontinuidade. A hierarquização é o passo seguinte e começa sempre das superfícies de menor ordem para as de maior ordem, nunca ao contrário. Muitas relações de contacto não poderão ser estabelecidas nesta etapa, devendo ser anotadas para posterior análise em campo.

5. Identificação das fácies. Retornar ao campo munido do fotomosáico e do transparente contendo as superfícies hierárquicas. A primeira providência nesta etapa é orientar o fotomosáico e verificar todas as relações de contacto pendentes, dirimindo as dúvidas quanto aos limites e geometria dos elementos arquitecturais. O passo a seguir é a descrição das fácies e sua localização exacta no fotomosáico, registrando-se todos os seus atributos físicos.

6. Medição das direcções das paleocorrentes e das atitudes das superfícies de descontinuidade. As medidas de paleocorrentes mais confiáveis são aquelas fornecidas pelos estratos cruzados acanalados ou tabulares. Entretanto, se os mesmos não estiverem disponíveis, pode-se utilizar de imbricamento de seixos, tomando-se os devidos cuidados na sua interpretação (e.g. Coimbra et al., 1992). É imprescindível que as direcções de paleocorrentes sejam projectadas com exactidão no fotomosáico, pois delas dependerá a confiabilidade da interpretação. O mesmo deve ser feito com as medidas relativas às superfícies de maior ordem hierárquica (3ª e 4ª ordem). Deve-se, também, descrever a natureza das superfícies de descontinuidade de maior ordem hierárquica (3ª, 4ª e 5ª ordem). Normalmente estas superfícies são erosivas e associadas a depósitos residuais do tipo lag ou conglomerados de grânulos.

7. Definição e codificação dos elementos arquitecturais e macroformas. A relação entre a direcção de paleocorrente e a direcção do mergulho das superfícies de descontinuidade define as macroformas constituintes dos pacotes rochosos.
A codificação é utilizada tanto para as superfícies de descontinuidade, quanto para os elementos arquitecturais e macroformas. Para as superfícies de descontinuidade são adoptadas letras do alfabeto, cuja ordem representa a sucessão cronológica de superfícies de 5ª ordem. Para superfícies de 4ª ordem, toma-se a letra referente à superfície de 5ª ordem imediatamente inferior e acrescidas de algarismos em ordem de sucessão cronológica. Por exemplo: a superfície de código A1 significa uma superfície de 4ª ordem localizada imediatamente acima da superfície de 5ª ordem mais antiga, a superfície A. Dá-se o código A2 à superfície de 4ª ordem superior a superfície A1.
Para os elementos arquitecturais e macroformas também é utilizado um sistema de código alfanumérico formados por dois conjuntos de dois dígitos separados por um hífen. O primeiro conjunto está associado à ordem hierárquico e o segundo o tipo elemento arquitectural ou macroforma. Por exemplo, 1A-DA e 1B-LS significam, respectivamente, uma macroforma de acreção a jusante (DA) depositada imediatamente sobre a primeira superfície de 5ª ordem e um elemento arquitectural LS depositado após a macroforma 1A-DA. Já o código 3D-SB representa o quarto elemento arquitectural (SB) que foi depositado sobre a terceira superfície de 5a ordem no afloramento (figura 11).

8. Interpretação do ambiente deposicional. A partir da predominância dos elementos arquitecturais e das macroformas e de analogias com exemplos modernos de ambientes aluviais é possível apontar as características do sistema deposicional estudado. Por exemplo, o predomínio de macroformas DA sobre LA (figuras 12 e 13).


Comentários sobre a análise arquitectural e a associação vertical de fácies
Comments on architectural analysis and vertical facies association

Do acima exposto, observa-se que a análise arquitectural oferece grandes vantagens sobre o método tradicional da associação vertical de fácies, pois possibilita a determinação da geometria dos pacotes arenosos, o que é de grande valia em campanhas de prospecção em depósitos aluviais (Ferreira-Júnior et al., 1995). A análise arquitectural fornece, ainda, informações sobre pequenas variações do estilo fluvial que seriam de difícil observação através de perfis estratigráficos, que visam a sucessão vertical de fácies (por exemplo, figuras 9 e 10). Nem sempre é possível determinar o estilo deposicional através de uma simples associação faciológica. É necessário que se conheça a direcção da acreção do elemento arquitectural e da macroforma e o ângulo que eles fazem com a direcção do fluxo, dissipando, ao final, interpretações ambíguas. De todo, a utilização da análise de elementos arquitecturais resulta no conhecimento das direcções de desenvolvimento dos sistemas aluviais, o que, os estudos de fácies e associações de fácies dificilmente conseguem mostrar.

As dificuldades observadas na aplicação do método de análise de elementos arquitecturais são comuns a todas as novas técnicas devido ao pouco conhecimento de suas nuanças e ao pequeno acúmulo de exemplos estudados e, portanto, de conhecimento adquirido. A difusão da análise arquitectural é de extrema importância, principalmente no que diz respeito à maior aquisição de dados e também da aplicação a outros ambientes deposicionais que não os aluviais (Miall & Tyller, 1991). Esta difusão é de suma importância para se adquirir um maior número de informações que possibilitem o tratamento estatístico das superfícies hierárquicas. A partir de seu domínio, esta técnica poderá ser aplicada com sucesso em depósitos de subsuperfície, como Miall (1994, 1996) vem apregoando ao longo dos últimos anos. A utilização da análise arquitectural em subsuperfície, principalmente em campanhas exploratórias de petróleo seria de extrema valia pois possibilitaria a definição não apenas da natureza do depósito, mas também forneceria informações a respeito do desenvolvimento das formas de leito, suas relações espaciais, direcções de acreção, geometria dos corpos, direcções óptimas de permeabilidade-porosidade e predição de possíveis reservatórios de hidrocarbonetos e água. Este cenário pode ser esperado a partir da aplicação de métodos geofísicos de alta resolução aliada à análise arquitectural.

No confronto entre a utilização da técnica de análise de elementos arquitecturais e da associação de fácies, as duas se mostraram concorrentes e complementares. Jones et al. (2001) utilizaram-se com sucesso das duas metodologias na reconstrução paleoambiental da Formação Rio Vero na Espanha. As secções verticais forma combinadas com a análise arquitectural, possibilitando a correlação entre diversas localidades

A distribuição espacial, a análise da ciclicidade e a caracterização do sistema deposicional, em regiões que apresentam afloramentos de baixa qualidade ou com pequenas dimensões laterais e/ou verticais, é melhor entendida através da análise vertical de fácies.

O emprego da análise arquitectural possibilita a identificação de variações locais no estilo de deposição que, normalmente, passariam desapercebidas pela análise convencional de fácies. É possível, também, definir a direcção de desenvolvimento de um elemento arquitectural ou macroforma e determinar as suas relações com os demais componentes de uma unidade deposicional. Por fim, a análise arquitectural é de grande importância em campanhas de prospecção em registros sedimentares, pois permite uma visão tridimensional dos corpos dos corpos rochosos.

A análise arquitectural fornece, ainda, informações concernentes à evolução tectónica , uma vez que a distribuição e associação dos elementos arquitecturais e macroformas estão directamente relacionadas aos diversos ambientes tectônicos de uma dada bacia.


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Recebido em 1-Maio-2001 / Received 1 May 2001
Revisto em 23-Julho-2001/ Revised 23 July 2001
Publicado em 12-Setembro-2001 / Published 12 September 2001

e-Terra (2001) - http://www.e-terra.pt - ISSN: 1645-0388